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Palle sozinho no mundo (Palle alene i verden, 1949)

  • Foto do escritor: Pedro Alves
    Pedro Alves
  • 4 de out. de 2020
  • 3 min de leitura

DISCLAIMER: Escolhas são perdas. Dito isso, essa exibição foi recheado delas. Para começar: somente encontrei duas cópias desse filme nessa vasta internet. Uma com melhor qualidade (que nem era tão boa assim) e outra com a duração integral. Optei pela duração integral, mas, após isso, deparei-me com outro empecilho: não existe legenda para esse filme. Nenhuma. Em nenhum lugar. Quase pensei em desistir, visto que o meu conhecimento de dinamarquês é nulo, mas por se tratar de um curta-metragem resolvi encarar. Entretanto, deixo claro no começo desse texto que minha visão foi severamente influenciada por essas duas perdas: tanto imagética, quanto de linguagem (por mais que não existam muitos diálogos, mas o protagonista expressa vários pensamentos durante a narrativa).

Ouvi falar pela primeira vez de Palle Alone in the World através do Mark Cousins. Nem me recordo mais quais foram os comentários específicos ditos por ele, mas a premissa da história me interessou bastante. No filme, acompanhamos o garotinho Palle (Lars Henning-Jensen fofíssimo) que, após acordar de sonhos intranquilos, encontra-se totalmente sozinho no mundo; sem a companhia de nenhum outro ser. A premissa me interessou sobremaneira por não estarmos acostumados a esse nível de isolamento e solidão infantil nas narrativas ficcionais. Estamos acostumados, sim, a outros tipos de solidão semelhantes. Em O Senhor das Moscas, por exemplo, acompanhamos o isolamento de um grupo de crianças em uma ilha deserta e sem adultos. Ou, também, em Jimmy Neutron: O Menino Gênio (2001), onde acompanhamos o que ocorre quando várias crianças se encontram sem responsável algum  —  só que, dessa vez, o pano de fundo é uma metrópole. Ainda temos o exemplo de Mogli, o menino que foi criado na selva por lobos e sem nenhuma presença humana.

Com uma exceção ou outra, esse isolamento de protagonistas infantis gera uma perigosa e fatal anarquia. Contudo, como seriam essas histórias se isolassem o protagonista de seus pais, amigos, animais…? Enfim, de todos os outros seres vivos.



A batalha entre o universo lúdico infantil e as preocupações do mundo adulto são constantes durante a narrativa. Desde seu primeiro plano, onde observamos os brinquedos espalhados e somos levados até os sonhos tumultuados do protagonista (com preocupações de cunho familiar, escolar e outras que não consegui distinguir); sabemos que Palle está em um constante estado de preocupação. Ele encontra-se sem controle algum frente ao poderio grandioso do mundo que o cerca. Isso é intensificado por escolhas técnicas muito acertadas: o pijama utilizado ao início e que parece ser muitos números acima do que o ideal para o personagem; as trancas e maçanetas sempre posicionadas de forma muito acima da altura de Palle; ou ainda os componentes de tamanhos irreais na cozinha.

O objetivo de Palle parece ser adquirir controle: afinal, ele pilota um bondinho, um carro de bombeiros e um avião. Ou estaria testando caminhos ao ser bombeiro, motorista de bondinho, cozinheiro etc? O protagonista segue as normas do universo adulto: ao pagar o brinquedo que desejava (por mais que o dinheiro tenha sido pego do banco e não pertença a ele). Contudo, essas repetições de norma se aproximam mais a rotinas do que a atos conscientes, como a sequência dele despejando o dinheiro através de um bueiro pode exemplificar. O personagem principal parou de dar valor ao dinheiro por conta da situação atual ao qual se encontrava, onde a troca monetária não faz mais sentido algum (não que tenha feito em algum momento); ou nunca havia dado valor algum a ele, de fato? (Essa, talvez, teria sido uma das questões respondidas se existisse uma legenda).

Chega a ser uma sensação incômoda nunca ter ouvido falar da diretora Astrid Henning-Jensen. De acordo com o IMDB, ela é considerada como uma das diretoras dinamarquesas mais famosas. Já coloquei o nome dela na minha lista (incrivelmente grande, admito) de realizadores que merecerem uma maratona. Tanto a sua direção nesse curta, quanto o roteiro, consegue ir gradualmente construindo uma atmosfera fantástica e onírica. De forma tão orgânica que, ao fim, quando acompanhamos o protagonista pilotar um avião em direção a lua, não achamos nem um pouco inverossímil. O fato de ter escalado o próprio filho para protagonizar a história também foi um grande acerto: percebe-se uma leveza e proximidade nos planos de Palle com alguns vislumbres da diversão que o garoto estava sentindo durante a realização do curta.



Palle Alone in the World consegue sintetizar e representar medos compartilhados tanto por adultos, quanto por crianças. O que torna uma experiência bastante interessante para nós, indivíduos mais velhos, que sentimos o drama da narrativa de duas maneiras distintas e simultâneas: como mulheres-feitas e homens-feitos que ainda sofrem com a possibilidade do isolamento (sentimento que muitos foram obrigados a enfrentar em tempos pandêmicos); e através de rememorações de uma espécie muito característica de inadequação sentida apenas durante a infância. O garotinho Palle só deseja se fazer entender e tomar as rédeas das próprias vontades.

No fim das contas, não é o que todos nós queremos?

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