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Pequenos Espiões 4 (Spy Kids: All the Time in the World, 2012)

  • Foto do escritor: Pedro Alves
    Pedro Alves
  • 14 de mai. de 2020
  • 8 min de leitura

Finalizando essa série de textos sobre os filmes infantis do Robert Rodriguez: ‘Pequenos Espiões: Todo o Tempo do Mundo’ (ou somente ‘Pequenos Espiões 4’). Vou começar esse texto falando sobre o assunto mais polêmico e que está diretamente envolvido na maioria esmagadora das produções dos filmes infantis comentados por mim durante essa série de publicações. Esperei para discorrer sobre ele nessa última postagem por duas razões: a) estava pesquisando para tentar entender toda essa loucura que havia sido noticiada; e b) o ápice ocorreu durante a realização dessa quarta aventura dos ‘Pequenos Espiões’. Pois bem. Chegou a hora de falarmos sobre Harvey Weinstein.

Para todos que, por alguma razão desconhecida, não estejam sabendo sobre um dos maiores escândalos hollywoodianos da última década, eu vou tentar resumir. Harvey e seu irmão Bob fundaram no finzinho da década de 1970 a Miramax. Caso não esteja reconhecendo o nome da produtora, ela foi responsável por alguns dos filmes mais importantes da década de 1990  — Pulp Fiction: Tempo de Violência (1994), Shakespeare Apaixonado (1998) e Gênio Indomável (1997) são apenas alguns exemplos. O sucesso deles foi tanto que fundaram uma nova produtora, a The Weinstein Company realizadora de sucessos como Django Livre (2012). É possível entender o status que os irmãos possuíam na high society por se estabelecerem como sinônimo de obras independentes de sucesso, assim como podemos imaginar que, em decorrência disso, Harvey possuía muitas formas de acobertar os seus inúmeros casos de assédios contra as atrizes que chamava para estrelar suas produções. No finzinho do ano passado, o caso veio a público através de um detalhado dossiê publicado pelo The New York Times contendo de opiniões a relatos. Essas denúncias tiveram bastante repercussões dando origem a movimentos como o ‘Time’s Up’ e o ‘#MeToo’.

Então. Com exceção de ‘A Pedra Mágica’ que foi produzido pela Warner Bros. Pictures, todos os filmes da franquia ‘Pequenos Espiões’ e ‘As Aventuras de Sharkboy e Lavagirl em 3D’ possuíram tanto Harvey quanto Bob Weinstein creditados como produtores executivos.

Contudo, a história é um pouco mais complicada.

A atriz Rose McGowan foi uma das primeiras mulheres a acusar publicamente Harvey Weinstein de estupro. Robert Rodriguez conheceu a atriz em 2005 e a questionou por não ter aceitado o convite para integrar o elenco de Sin City : A Cidade do Pecado (2005). A atriz então explicou que estava na lista negra das produções de Weinstein e revelou a história aterrorizante sobre o que Harvey havia feito com ela sete anos antes. De acordo com o diretor:

Falei que ela não estava na lista negra de nenhum dos meus filmes e Harvey não poderia me falar quem colocar no elenco. Então falei que estava começando a escrever um filme com Quentin Tarantino e, se ela estivesse interessada, escreveria para ela uma personagem muito forte e faria dela uma das protagonistas. Queria que ela tivesse um papel de destaque em um grande filme, para tirá-la da lista negra e a melhor parte é que poderíamos ter a Weinstein Company pagando por tudo isso […]. Eu queria ajudar. Tínhamos um plano e, mais importante, tínhamos uma missão.

Os dois tiveram um curto relacionamento durante a realização de Planeta Terror (2007), onde Rodriguez cumpriu sua promessa.

A história consegue ser ainda mais complicada.

Prestes a lançar a sua autobiografia, McGowan acusou o diretor texano em um artigo na Vanity Fair de aterrorizá-la no set usando seu trauma por conta do estupro que sofreu.

Era como se eu vivesse em um mundo de cabeça para baixo. […] Ele [Rodriguez] parecia ser um cara sensível, e eu me apaixonei por ele. Então ele usou o que eu lhe confidenciei para fazer jogos mentais comigo.

A atriz ainda afirma que a traição final de Rodriguez teria sido a venda do longa-metragem para a Dimension Films, liderada por Bob Weinstein.

Rodriguez fez uma declaração sobre as acusações de McGowan explicando o financiamento pelos Weinsteins. Sobre a cena envolvendo um quase estupro da personagem de Rose, ele declarou que:

A cena descrita no artigo da Vanity Fair onde o estuprador provoca a personagem interpretada por Rose (antes que ela se vire, o apunhale e o mate) estava em todos os tratamentos do roteiro desde o rascunho inicial dado ao elenco e a equipe em 24 de janeiro de 2006. Além disso, essa mesma cena não foi sequer filmada até 5 meses depois em 28 de junho de 2006. Novamente, se houvesse alguma objeção à cena, haveria tempo de sobra para ser resolvida. Nunca foi tratada como sendo um problema. Na verdade, o objetivo da cena era ser empoderador, onde sua personagem vira a mesa contra seus opressores.

Qual a razão dessa minha explicação? Porque Harvey Weinstein interferiu diretamente na realização desse quarto filme da franquia de espiões mirins. Robert Rodriguez não queria fazer outro ‘Pequenos Espiões’ e não estava com pressa de fazer nenhum filme para o produtor após toda a confusão envolvendo a escalação de Rose McGowan como protagonista, além de ser diretamente culpado pelo fracasso de Grindhouse (2007)  —  projeto idealizado por Rodriguez e Quentin Tarantino que consistia nos longas Planeta Terror e À Prova de Morte. No entanto, Rodriguez estava devendo a Weinstein mais um filme por conta de um contrato assinado antes do lançamento de Grindhouse e Weinstein queria uma sequência.

Pequenos Espiões 4 foi o resultado.

 

Durante toda a projeção de ‘Pequenos Espiões: Todo o Tempo do Mundo’nos deparamos diante de um diretor cansado de sua própria criação. Tudo parece desarmônico. Os mesmos erros do terceiro capítulo da história são cometidos novamente em uma narrativa sem carisma ou a energia das obras anteriores.

Acompanhamos Marissa, espiã aposentada da OSS, que possui uma pacata vida sendo decoradora de interiores. Ela tem um feliz (?) relacionamento com Wilbur com quem teve uma filha. Contudo, a ex-espiã é rejeitada pelos dois filhos do antigo relacionamento do companheiro: Rebecca e Cecil. Foquei em Marissa, pois ela é a real protagonista do filme e sua missão envolve deixar de esconder segredos para sua família.

O prólogo inicial do filme carrega certa força ao colocar Marissa, ainda grávida, como uma espiã na ativa. Tudo bem que existe uma piada contínua envolvendo o trabalho de parto da personagem e sua caçada pelo vilão ‘Guardião do Tempo’ (Time Keeper, no original). Essa sequência inicial me fez perceber a falta de personagens grávidas mostradas de maneira ativa (como realmente é a gravidez) e não como seres a serem protegidas — em filme no geral, mas, especificamente, em obras infantis. Não da forma que é mostrado aqui, claro! Vejam Um Lugar Silencioso (2018) por falar nisso! Após a captura do vilão, descobrimos através de Danger D’Amo, novo chefe da OSS, sobre o projeto Armageddon.

Ainda no prólogo, ao chegar ao hospital em pleno trabalho de parto, Marissa encontra com Wilbur e seus dois filhos. Logo no primeiro plano que vemos os irmãos Rebecca e Cecil, eles estão jogando briga de polegares, o que, além de indicar a rivalidade existente entre eles, faz uma referência aos Thumb-Thumbs do filme original.

















O filme é recheado dessas homenagens e referências a trilogia original e, suspeito, que sejam as melhores coisas da obra.
















































Vou aproveitar para falar sobre a trama de Wilbur, pois ela é tão profunda quanto um copinho de café. Ele é um pai relapso, um marido medíocre e é famoso por apresentar um programa de televisão chamado Caçador de Espiões. Durante a narrativa, ele descobre que sua esposa era uma espiã, decide se separar dela (mesmo ele próprio sendo o maior dos lixos) e, no fim, volta e consegue ajudar sua família a salvar o mundo. Uma pena terem desperdiçado o Joel McHale dessa maneira. Uma coisa que exacerba durante esse quarto filme são as piadas escatológicas personificados na figura da bebê. Fezes, vômitos, comidas de bebê, etc. Tudo isso acaba voando em alguém, seja um vilão ou herói. Provavelmente, essas podem ter sido formas de protesto do diretor ao se ver obrigado a produzir uma continuação sem vontade. Contudo, para nós, espectadores, é desgastante vermos tantos minutos dedicados a piadas com fluidos corporais ou líquidos suspeitos.
































O MacGuffin desse filme é um cordão dado a Rebecca por Melissa que contem a única forma de parar o projeto Armageddon. Anos após o prólogo, o ‘Guardião do Tempo’ consegue escapar sem nenhuma explicação e é capaz de fazer o que queria: adiantar cada vez mais o tempo da humanidade, o que pode estar diretamente relacionado ao tal projeto do cordão. Seu objetivo final permanece um mistério e vemos nossos heróis da OSS se esforçarem para conseguirem pará-lo.

Assim como no filme original, capangas invadem a casa atrás das crianças. Rebecca e Cecil descobrem que sua madrasta é uma espiã e são mandadas para a OSS. Durante o filme, elas auxiliam na resolução envolvendo o projeto Armageddon e do ‘Guardião do Tempo’. Não falarei muito sobre esse plot por envolver viagem temporal e ser o único fio narrativo que importa, no fim das contas. Por mais que a resolução seja despropositada e inverossímil. Caso alguém assista, talvez até seja surpreendido pelo plot twist final.

















Queria fingir que esse filme não possui nenhuma relação com os três anteriores e que não conta com a participação nem de Carmen, nem de Juni e nem de Machete. Contudo, essa não é a realidade. Descobrimos a ligação de Carmen com as crianças: aparentemente, Marissa é uma tia nunca mostrada ou citada durante os outros filmes. Descobrimos que Juni está desaparecido, tal qual Carmen no terceiro filme. Pior! Descobrimos, quando Juni reaparece, que a relação entre ele e a irmã está pior do que nunca! O que deixa uma sensação de que ou eles não aprenderam nada com as aventuras anteriores, ou todas elas foram irrelevantes para essa quarta parte.

















Um ponto que eu havia reclamado em todos os outros filmes de Rodriguez era a idealização que eles possuíam sobre a constituição de uma família. Em A Pedra Mágica, isso já havia começado a mudar através da relação entre “Nose” Noseworthy e seu pai solteiro. Aqui, vemos uma outra formação familiar: madrasta, pai e filhos de outro relacionamento. Por mais que continue pecando na diversidade, não podemos deixar de observar uma evolução do pensamento do diretor durante os anos. Ok que essa formação é colocada em xeque durante todo o filme existindo uma jornada de aceitação da madrasta. Contudo, já é uma mudança.

Outro ponto interessante é a figura do menino Cecil que é retratado como um deficiente auditivo. Inclusive, os aparelhos que utiliza para auxiliar na sua audição são usados como elementos em momentos bastante divertidos da aventura. Uma representatividade muito bem-vinda.




As crianças também não permitem que seus gêneros sejam definidos por cores! Aprende Sharkboy!


O filme também foi lançado em gloriosos 4D! 4D?, você me pergunta. Sim, meu amigo. As pessoas sentiam cheiros durante a exibição do filme! Como? Tudo começou com Smell-O-Vision, sistema que liberava odor durante a projeção para que o espectador pudesse “cheirar” o que estava acontecendo. A técnica foi criada por Hans Laube e fez sua única aparição no filme Scent of Mystery (1960).

Em 2010, como um legado do Smell-O-Vision, o filme norueguês Kurt Josef Wagle og legenden om Fjordheksa (2010) foi lançado nos cinemas com cartões de raspar e cheirar que o público pôde usar durante a exibição do filme. Um ano depois, Robert Rodriguez xumpinhou a ideia e anunciou como “4D Aroma-Scope”.

Cartela dada durante a exibição de ‘Pequenos Espiões 4’ (2011).


Pequenos Espiões 4 não consegue ser o começo de uma nova trilogia, nem funciona como entretenimento. A narrativa esquece de dar protagonismo para as crianças e de retratá-las ativamente, sendo sempre necessário que os adultos deem a ação final  —  o que havia sido o trunfo da franquia. Os personagens antigos que aparecem na narrativa poderiam ter sido esquecidos, já que suas jornadas se transformam em problemas circulares e não progressivos. Ao olharmos toda a história de produção que está envolvido nos bastidores, conseguimos compreender que o próprio diretor não possuía vontade de realizar essa sequência. É perceptível que Pequenos Espiões 4 é um filme sem alma.

 

É isso, galerinha.

Aqui termina essa série de postagens, onde eu me debrucei em cada um dos longas-metragens infantis do Robert Rodriguez. O que me motivou inicialmente a realizar tal pesquisa, para além de serem filmes que marcaram minha infância, foi a falta de seriedade com a qual produções infantis são tratadas. Como se, por alguma razão, fossem “menos filme” do que outros gêneros cinematográficos.

Pois bem. Espero ter mostrado através das comparações, referências visuais e estudo sobre a narrativa que filmes infantis possuem tanto valor quanto os demais. Optei pelas produções do Rodriguez por ele ser conhecido pelos seus filmes adultos sanguinolentos e esse preconceito da audiência ficar bem mais perceptível. Acho que após escrever sobre alguns de seus filmes direcionados ao público mais novo, outros de seus trabalhos foram relegados ao final do meu ranking pessoal.

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